Você sabia? “Cachorro” também significa filhote de leão, tigre, lobo…
Muito curioso quando nós brasileiros assistimos a algum vídeo em língua espanhola e nos deparamos com gente chamando filhote de tigre de “cachorro”. Como assim? Pois é… Algo estranho para nós que falamos português, seja em Portugal, Brasil ou em outros cantos, porém não para nossos hermanos da América Latina ou Espanha, pois na língua portuguesa esse significado também existe. Veja o que diz o dicionário Aurélio:
“Significado de cachorro: substantivo masculino; cão novo; qualquer cão; cria da loba, da leoa e de outros animais parecidos com o cão.”
A mesma explicação encontramos no dicionário Michaelis:
“sm. (lat vulg *catlu+orro) 1. cão novo ou pequeno. 2. (pop.) qualquer cão. 3. cria de leão, tigre, urso, etc.”
Vejamos também o que nos diz o dicionário Caldas Aulete:
“1. cão novo ou pequeno; 2. qualquer cão; 3. cria de leão, lobo e de outros animais semelhantes ao cão.”
Claro que há outras acepções, como homem de mau caráter, criança peralta, etc., mas o tema aqui é cachorro como sinônimo de filhote de outros animais, não só de cão. Curioso que os dicionários falam de animais parecidos com cães, mas o Michaelis cita até urso… Seja como for, um felídeo se parece com um cão? Os dois andam sobre quatro patas, mas parece um pouco forçada a afirmação de que um tigre, leão ou leopardo se assemelhem a um cão.
No espanhol, o termo “cachorro” está realmente mais ligado ao sentido original de “filhote” de diversos animais. Por exemplo, “cachorro de lobo”, “cachorro de raposa”, etc. Essa diferença semântica na prática entre as línguas é um ótimo exemplo de como palavras com a mesma origem podem evoluir para sentidos diferentes, conforme a cultura e uso regional.
Muita gente deve estar se perguntando sobre a etimologia da palavra, mas ela é incerta e obscura. O Aurélio traz como origem o verbete latino “catulus”; sendo que, de fato, esse termo se refere a filhote de cachorro; e “catellus” era usado para filhote de gato. Mas a grafia de ambos não lembra nada o vocábulo “cachorro”.
Alguns dicionários trazem a palavra cachorro como sinônimo de cão pequeno, mas não aplicado a cães adultos de porte grande, entretanto, segundo o dicionário europeu Priberam, a palavra “cachorro” no Brasil, Portugal e ilha da Madeira também se aplica aos grandões. Como se pode ver, o sentido do verbete tornou-se bem elástico com o tempo.
E aí? Achou tudo isso uma verdadeira cachorrada? Qual a sua opinião?
Marcos Antonio Fiorito
Quem diria?! Saudade e solidão têm a mesma origem
“A saudade é a memória do coração”, escreveu certa vez o romancista e teatrólogo maranhense Coelho Neto. Já Olavo Bilac, com aquele talento que lhe era singular, afirmou: “A saudade é a presença dos ausentes.”. Quantas vezes você já ouviu dizer que saudade é uma palavra que só existe na língua portuguesa, que ela é, até certo ponto, intraduzível? À primeira vista, tentar explicar saudade para um estrangeiro é uma tarefa ingrata, mas nem tanto…
De onde surgiu essa palavrinha tão especial? Se você puxar o fio da meada, vai descobrir que o termo saudade nasceu no latim vulgar, mais precisamente da palavra “solitate” (da raiz solitas, solitatis), que basicamente queria dizer solidão. Com o tempo, essa palavra foi se transformando; primeiro em “soidade” ou “soedade” no português antigo, já indicando um sentimento de quem está só, porém começava já a ganhar aquelas camadas de melancolia e significado de “sentir falta”, como conhecemos hoje.
Foi durante a Idade Média, enquanto o português se emancipava do galego e do latim como uma língua com identidade própria, que “soidade” virou de vez “saudade”. E não foi só mudança de letra… O sentido também se aprofundou: deixou de ser só a solidão física para abraçar toda aquela dor gostosa de quem lembra de algo bom que ficou para trás.
Aí vieram as Grandes Navegações, com embarcações partindo para o desconhecido. Imagina só: marinheiros deixando famílias inteiras, amores de juventude, a terrinha onde nasceram… Tudo para se aventurar num mar sem fim. Muitos sabiam que nunca mais voltariam. Foi aí que a saudade virou quase uma filosofia portuguesa, um jeito de viver e sentir que marcou para sempre aquele povo.
Ó mar salgado, quanto do teu sal
São lágrimas de Portugal!
Por te cruzarmos, quantas mães choraram,
Quantos filhos em vão rezaram!
Quantas noivas ficaram por casar
Para que fosses nosso, ó mar!
(Fernando Pessoa – Poema x Mar Português.)
Quando chegou ao Brasil, nossa saudade ganhou tempero novo. Misturou-se com a batida do tambor, com o lamento indígena, com a alegria e a dor dos encontros e desencontros que formaram nossa gente. Aqui, ela ganhou ritmo, virou música, poesia de cordel, conversa de fim de tarde… A saudade brasileira tem algo de celebração – a gente sente saudade, mas de certa forma isso é um jeito de manter vivo o que já passou.
É por isso que, até hoje, a saudade está entranhada na nossa música, nos nossos livros, no nosso papo de botequim. É tristeza, mas também é carinho; é ausência que se faz presente; é passado vivo no agora. Por isso mesmo que a gente nunca conseguiu explicar com exatidão para os gringos; afinal, como traduzir em uma palavrinha só algo tão imponderável?
Marcos Antonio Fiorito
Essa língua portuguesa… Cara (rosto) | Cara (preço) | Cara (pessoa)
Vamos falar sobre uma curiosidade da nossa língua portuguesa que pode confundir quem é de fora e não fala nosso idioma: a palavra “cara” pode ter significados bem diferentes. Por sinal, essa peculiaridade da nossa língua, por onde uma mesma palavra pode ter sentidos tão distintos, causa espécie em muitos estrangeiros. E não é para menos, pois são significados que mudam totalmente de acordo com o contexto.
Cara (rosto)
Quando falamos “cara” no sentido de rosto, estamos nos referindo à parte da frente da cabeça humana, onde estão os olhos, o nariz e a boca. Por exemplo: “Ela tem uma cara simpática!”. Nesse caso, “cara” é sinônimo de rosto, e é aquela parte que todo mundo adora mostrar nas selfies! Então, se alguém disser que você tem uma “cara bonita”, pode ficar feliz, pois estão elogiando a sua face!
Cara (coisa de valor elevado)
Agora, quando alguém diz que algo é “caro”, está se referindo ao preço alto de um item ou serviço. Por exemplo: “Esse carro é muito caro!”. Então, esse “caro” significa que custa muito dinheiro, algo que pode ser pesado no bolso. Quando se diz: “Essa joia é cara!”, não tem nada a ver com o nosso rosto! Outra expressão com significado de alto valor é: “Visitar os meus amigos me é uma coisa muito cara!” Por isso se diz: “Cara, Fulana; Caro Fulano”.
Cara (pessoa)
“Cara” também pode ser usado para se referir a uma pessoa, geralmente de maneira informal. Por exemplo: “Aquele cara é muito sério.” Nesse contexto, “cara” é sinônimo de sujeito, indivíduo ou simplesmente alguém. É uma maneira descontraída e cotidiana de falar sobre uma pessoa, muito comum no português falado no Brasil.
O segredo está no contexto
É fascinante como a mesma palavra pode ter significados tão diferentes, não é? A diferença de sentido fica evidente quando observamos o contexto da frase. No primeiro, estamos falando de algo físico, visível, nosso rosto; no segundo caso, estamos falando de valor financeiro; no terceiro, de alguém. Por isso, prestar atenção no contexto é essencial para não se confundir.
Então, se ouvir alguém falando “cara” por aí, já sabe: pode ser rosto, preço de algo ou pessoa. O que importa é não se confundir!
Antes de nascerem ou antes de nascer?
No dia 26 de setembro, o portal R7 publicou uma chamada com erro de concordância: “Com dias de vida ou antes nascerem, filhos de famosos fazem sucesso”. À primeira vista está tudo certo, o sujeito é “filhos” e, portanto, concorda com “nascerem” e com “fazem”, no entanto, só o verbo fazer deve concordar com filhos, nascer permanece no infinitivo singular. Invertendo a frase, veremos como fica: “Filhos de famosos fazem sucesso dias antes de nascer.” Na língua portuguesa, quando diz respeito ao mesmo sujeito, só o primeiro verbo deve ir para o plural, o segundo permanece no singular. Tanto isso é verdade, que a pessoa que fez a revisão corrigiu o título na matéria principal, mas cochilou e esqueceu de corrigir na chamada. Confira na imagem acima. Notícia visualizada em 26/09/2022.
Para encerrar, temos uma frase bíblica que ilustra bem essa questão: “Construirão casas para nelas morar, plantarão vinhas para comer seus frutos” (Is 65, 17-21). Note que não está dito: “para nelas morarem, já que o primeiro verbo foi conjugado no plural: “construirão”. O mesmo no que diz respeito à segunda parte: “plantarão vinhas para comer seus frutos”, em vez de “comerem seus frutos”.